sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Dia a dia





Quando pensei que tinha todas as repostas, tropecei. Tudo embaçou de repente, sem aviso prévio ou qualquer controle. Me vi ali, naquele emaranhado de dúvidas agora inéditas, controversas, desconexas.

Acreditava já ter ultrapassado tantos limites que me olhar no espelho deveria ser uma tarefa natural. Como é fácil enganar-se sem perceber. Se a gente soubesse a profundidade que temos dentro de nós, a grandeza dos nossos pensamentos e até onde nossa mente é capaz de nos levar, não pularíamos tão rápido dentro de conclusões que parecem tão certeiras.

De certo, na verdade, há pouco. Talvez nada. Prefiro acreditar que há muito, tudo, sempre. Escolho reconhecer que não sei, mas que não desisti de procurar. Acabo buscando refúgio em lugares que pensei já ter anunciado despedida, mas que ainda não foram de fato embora. 

Quanto mais permeio o não entendimento de tudo que pulsa dentro de mim, mais descubro que o caminho é infinitamente longo. Exercício diário, este, de desfazer os nós, reescrever verdades, apagar momentos, desprender-se de ilusões. 

E nesse escuro que parece tomar conta do corpo e fazer o coração bater mais rápido é que mora a mudança que buscamos. Ela sim, permanece. Nos faz respirar, expirar, e enfim, estar. Ser.

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Sob a superfície










Estar sob a superfície é nunca ter a chance de experimentar o próprio ser.

É deixar-se levar pelo simples, pelo material, por tudo aquilo que não alcança os centímetros necessários para o arrepio.

Caminhar somente no raso apenas garante a segurança de situações entediantes. Manter-se ali, nas metades de diálogos prontos e copos meio cheios, é fácil demais.

Desafiante, no entanto, é pular no desconhecido. Habitar-se na dúvida. Permanecer nos questionamentos, buscar o mais profundo.

Encontrar aquilo que realmente, verdadeiramente, mexe com o coração, exige coragem.

Delirar entre aquilo que ora acreditávamos e aquilo que ainda não sabemos com plena convicção só faz sentido quando nos permitimos.

Ter a capacidade de mergulhar mais fundo em tudo aquilo que tem potencial para abalar nossas estruturas é o que tem movido esses pés por aí.

E são nesses tropeços que o corpo percebe que estar na superfície nunca é e nunca será suficiente.

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Sobre ser






                                                                                                 Ph: Marco Manela


Andei pensando e descobri nesses últimos tempos, entre semáforos e esquinas que permanecem iguais, que há pedaços em mim irrecuperáveis.

Pedaços que se transformaram. Que permutaram, caminharam e que agora, as 2h20 da manhã de um dia qualquer, deixaram de ser quem eram.

Assusta ver partes nossas serem deixadas pra trás, sem mais nem menos. Aliás, mais. Muito mais. Será que é tão imperceptível aos olhos dos outros o quanto realmente, é mais?

Mais verdadeiro. Mais sincero. Mais profundo.

Constatar que o antes já não basta, que o antigo não satisfaz e que o passado não é suficiente me dá falta de ar.

Transitar entre esses caminhos de busca provoca tontura.

Acompanhar mesmo que aos poucos meus passos em direção a mim mesma, tira o sono. Mas, acho que no fundo, esse misto de sensações que transitam aqui dentro é natural. Afinal, não é sempre que conseguimos estar diante de nós mesmos sem tropeçar.

Então, cabe a nós conhecer, reconhecer, ser. E finalmente, agradecer pela grandiosidade que é poder contemplar a si mesmo.



terça-feira, 7 de junho de 2016

Somente o necessário



Recentemente li um texto numa coluna do Estadão, desses que acabam se tornando virais e todo mundo compartilha no Facebook. Ele dizia sobre como a nossa, quer dizer, a minha geração é de certa forma, descartável. Como para nós, tudo se torna efêmero com muita facilidade, nossos relacionamentos não duram, nossos empregos não são estáveis, nossos interesses mudam a cada cinco segundos. Em parte, tudo isso é culpa da tecnologia em que estamos imersos praticamente 24 horas por dia, mas outra grande parte também é nossa, por nos sentirmos “livres” para arriscar mais. Talvez a gente ainda não tenha aprendido que o mercado não está preparado para nossa ânsia de viajara cada seis meses ou para nossa vontade de curtir a vida antes da aposentadoria.

Recém-formada, com alguns estágios, um intercâmbio, inglês fluente e um diploma na mão, arranjar um emprego compatível não deveria ser uma tarefa impossível. Era assim que eu e mais tantos outros jovens nos seus vinte e poucos anos pensavam. Erro nosso. Final de 2015 e uma das maiores crises da história brasileira.

Vale lembrar que a crise não é só econômica, e sim também política. Como exemplo, em meados de janeiro de 2015, havia uma expectativa de que houvesse uma reforma fiscal que poderia fazer o governo atingir um equilíbrio orçamentário, criando um panorama mais otimista a médio prazo. O então ministro da fazenda Joaquim Levy, propôs um plano de ajuste fiscal, porém o momento político já se encontrava desfavorável, com boa parte da base de apoio da presidente reticente, descolando-se das posições do governo.

Não podemos nos esquecer da Operação Lava Jato, que está investigando o maior escândalo envolvendo a Petrobrás, as grandes empreiteiras nacionais, além de diversos políticos. Esse e tantos outros absurdos, como as pedaladas fiscais, fizeram o Brasil sofrer uma paralisia econômica em larga escala.

Como se não bastasse, a economia recessiva atingiu a depressão com o rebaixamento da nota de crédito do Brasil por duas agências internacionais de classificação de risco. Associando-se a tudo isso, o mercado reagiu negativamente às tentativas de recuperação e com isso, nós acompanhamos incrédulos à valorização do dólar frente ao real, sendo uma das mais altas dos últimos quinze anos.

Com a taxa de câmbio nas alturas, a viagem internacional de fim de ano foi reduzida a curtir uma praia no litoral paulista mesmo. Já a inflação fez com que nosso cinema e jantar se reduzisse para uma noite de netflix e pipoca de micro-ondas. E na hora de declarar o imposto de renda? Para qual país que dá vontade de fugir?

Mas, fato é, a taxa de desemprego no país é a pior desde 2009, quando a crise no mercado hipotecário americano afetou toda a economia mundial.  Só a área de informação, comunicação e atividades imobiliárias e administrativas cortou cerca de 900 mil pessoas até o fim do ano passado.

E mesmo quando existe a oferta de emprego, será que já paramos para analisá-las com calma? Na área de comunicação, por exemplo, um cargo de assistente de mídia exige mais qualificações que toda minha lista de supermercado mensal. Tem que saber analytics, técnicas de SEO, heavy user de mídias digitais, todo pacote office, photoshop, indesign, edição de vídeo, illustrator... Mas, calma! Como que arranjamos tempo para nos especializarmos em tudo isso, se trabalhamos além do horário comercial e ainda decidimos fazer uma pós-graduação à noite? Em teoria nos tornamos experts em tudo, quando na verdade sabemos apenas um pouco de cada coisa. Quem nós queremos enganar?

Além de tudo isso, se nos compararmos com a geração dos nossos pais ou avós, fica nítido o quanto nosso poder de compra mudou. Aos vinte e poucos, quantos de nós já temos um imóvel próprio, ou temos autonomia financeira suficiente para sair de casa?

A economia na era digital com certeza tem remodelado nossa forma de ver e viver o mundo. É através da tela dos nossos celulares que acessamos nossa conta bancária, fazemos transações, nos relacionamos e de certa forma, convivemos e nos fazemos presentes mesmo que longe.

Aprendi na minha aula de economia da pós-graduação que a renúncia de algo é o que dá valor aquilo. Frase de impacto que me fez refletir sobre milhares de outras coisas. Mas, o que eu tiro essencialmente dela é: quanto estamos dispostos a renunciar por aquilo que julgamos ser necessário? E o que é por fim, necessário?

Calma, respira. Se aos vinte e três você ainda não encontrou, pode apostar que tem gente com quarenta que ainda busca esse insaciável, “necessário”.

segunda-feira, 28 de março de 2016

Sobre ir





 
"All I know is that you're so nice
You're the nicest thing I've seen

I wish you couldn't figure me out
But you'd always wanna know what I was about"

Kate Nash - Nicest Thing


Difícil saber se dói mais nas metades que permaneceram ou em tudo que eu nunca vou te dizer. Complicado tentar desfazer todas as reticências que você deixou que eu colocasse ao longo desse tempo. Machuca fundo me calar, guardar, esquecer, deixar passar, ir.

Descobri em mim um amor que não sabia que existia assim. Resisti ao encontrar esses sentimentos nas partes mais escondidas do meu eu. Denunciei essas mágoas pro meu cérebro e ele só me retribuiu com lágrimas. Passei por cima dos muros tão altos que minha mente criou. E foi ali, naquele canto escuro do meu lado esquerdo que eu deixei de enxergar. 

Foi em cada momento que eu não posso reviver mas que eu guardo comigo, que eu fingi que meus motivos não importavam, que meus princípios não valiam e que meus medos eram superficiais. Se é tudo tão profundo então só queria poder voltar pro raso.

Pra aquele sorriso, pro dia que eu não precisei dizer nada e você entendeu. Pra quando não era necessário nenhum entendimento. 

Se eu pudesse, meu bem, talvez sim, eu ficasse. Talvez, eu escolhesse o seu sorriso dentre tantos. E aí, quem sabe eu poderia viver o que você sempre me prometeu, me mostrou pedaços e me provou que era possível. 

Se minhas verdades não fossem tão reais, se minhas vontades não prendessem meus pés no chão e se eu me permitisse, provavelmente não existiriam meias palavras, distância e silêncio.

E te deixar ir é permitir o esquecimento. É abrir a porta do novo e trancar teu amor longe. É doer ver tua felicidade em outros abraços. É acreditar estar fazendo o certo, mas permanecer em constante dúvida. 

Te ver ir, é me deixar ir também. E, sinceramente, não sei medir o que dói mais. 

Ir. Apenas ir. 

terça-feira, 8 de março de 2016

Hoje




Hoje direi que sinto tua falta. Do jeito que só você me fazia sorrir com os olhos, da calmaria e tempestade que me invadia toda vez que você aparecia.

Não te ligarei, mas estou aqui pra te dizer que dói. Que eu sinto falta de deitar no seu ombro, da voz da sua risada, do carinho no meu cabelo.

Sinto falta daquilo que ainda me desperta vontade de te ver. Sinto falta daquilo que fomos e daquilo que nunca vamos ser. Eu sinto falta de dizer o quanto te quero bem, mesmo que te queira longe. Sinto falta de ouvir de você que vai ficar tudo bem. 

Dirijo e penso em desviar do meu destino pra dizer que foi coincidência esbarrar em ti. Penso melhor e sigo a mesma rota, mas eu sinto falta. Sinto falta do caminho decorado e da certeza de te ver no fim do dia.

Eu sinto falta de planejar mil futuros quebrados pela minha racionalidade. Sinto falta da sua certeza na minha dúvida. Sinto falta do seu gosto musical, das nossas escolhas no cinema, das chances remotas de ir ver o mar com você.

Sinto tanto que não consigo discar seu número. Não faz sentido sentir tanta falta mas não sentir o mesmo que ti. Sinto falta de não fazer sentido com você. Sinto você todos os dias.

Te sinto toda vez que alguém não enxerga além do que meus olhos denunciam. Talvez, só você consiga entender o que eu não entrego de primeira. Sinto falta de todas as primeiras vezes fazendo algo novo. Sinto falta porque parece que só tem graça se é você segurando minha mão. 

Eu sinto falta de você.

E apesar de tudo, eu poderia dizer que sinto muito por isso, mas hoje, só consigo sentir sua falta.